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Charge é para fazer pensar (ou: a falta que interpretação de texto faz)

12/05/2024

Charge da Folha de São Paulo, de autoria do cartunista Jean Galvão, ilustrando uma criança consolando a outra, de sua própria maneira infantil, em cima do telhado de uma casa submersa sob as águas sujas de uma enchente enquanto que seus pais olham para cima, procurando nos céus por helicópteros de resgate.

A exatamente uma semana atrás, esta charge do excelente cartunista Jean Galvão foi publicada na respeitadíssima Folha de São Paulo e disponibilizada online. O tópico com o qual ela dialoga é claramente a terrível enchente que vêm atingindo o estado do Rio Grande do Sul (onde estou localizado) desde o início do mês, mas a mensagem que ela quer passar aparantemente não é tão clara assim, a julgar pelo alvoroço que sua publicação causou nas redes sociais. Milhares de pessoas estão acusando a ilustração - e, subsequentemente, seu autor e o periódico em que foi veiculada - de ser insensível; de (desculpe a expressão) gozar da cara daqueles que estão sofrendo por causa do maior desastre climático que o estado, um dos mais vulneráveis a esse tipo de fenômeno do Brasil, enfrenta desde 1941, quando na verdade não é bem assim - pelo menos ao meu ver.

Ao ilustrar uma criança consolando a outra, de sua própria maneira infantil, em cima do telhado de uma casa submersa sob as águas sujas da enchente enquanto que seus pais procuram nos céus por helicópteros de resgate, a charge mostra como até os traumas mais extremos não afetam (ou afetam pouco) a imaginação das gerações mais novas, que enxergam tudo o que ocorre ao seu redor sob lentes rosáceas de inocência e fantasia. I'm not speaking out of my ass here, eu mesmo vi isso com meus próprios olhos ontem, ao trabalhar como recreador infantil voluntário em um abrigo temporário junto de um grupo de amigos valiosíssimo para mim.

E se isso não representa um nível de força e resistência emocional incrível, realmente admirável, eu não sei o que isso representa. Talvez nós adultos deveríamos almejar ser tão fortes quanto as crianças que criamos, não?